Olha, eu juro que racho um dobrado pra tentar ser uma pessoa melhor. Paro na faixa até pra gente feia, dou conversa pra hippie com gaita, deixo a doida que anda pelada pelo Vieiralves mijar no meu pé, de boa. Mas é tiro e queda: sempre rola alguma situação que me mostra o quanto eu sou fela da puta - e logo um daqueles orgânicos, naturais: a feladaputagem segrega dos meus poros sem que eu faça nenhum esforço.
Tava lá o gringo. Mas não, pera; vamo contextualizar: tava o lá gringo na Ponta Negra - e gringo na Ponta Negra já é um combo digno de nota. Ponta Negra, cês sabem: cartão-postal de Manaus (provavelmente o único). Tem o calçadão, tem as luzes, tem a porra do chafariz que eu nunca vi ligado mas diz-que quando liga é de umedecer as xoxota de tão lindo, e tem o barranco escroto que eles tentaram embelezar, mas não deu muito certo - aquele barranco perto do anfiteatro, que tem uma passarela em cima, um mirante do lado e um monte de farinhado (do buxo cujo perfilado lembra o "B"de "Barriga" da cartilha Caminho Suave - quem for velho vai lembrar) lá em baixo, paquerando as catirina.
E tinha o Gringo.
Gringo, sem nenhum extra, já é uma figura engraçada: os do tipo alfa, igual ao referido, têm sempre aquela carona vermelha de quem nunca aprendeu a passar mais de meia camada de filtro solar; aquela expressão meio abestalhada de oh beautiful; umas roupas fiéis ao look cada peça de uma cor e cujos tamanhos são escolhidos sob medida pra vestir mal; tudo isso emoldurado por infalíveis meiões de Maria Mijona, quase até a virilha, que eu não faço ideia de onde eles compram, mas parece que é kit obrigatório exigido pela Casa Branca, sob pena de deportação. Claro que brasileiro lá fora também é motivo de deboche pra meio mundo - porque brasileiro adora fazer macaquice em terra dos outros, como se fosse o quintal com pagode e banho de borracha da mãe deles. Mas só gringo tem essa mágica de provocar risada até parado em pé sem fazer nada.
Voltando: esse gringo em particular, que poderia muito bem ter ficado em pé sem fazer nada pra evitar o pior, resolveu ser mais ousado e improvisar um esporte radical ali mesmo: ignorou a escadaria lateral que garantia uma jornada assim, mais civilizada, pra quem quisesse descer o barranco. Esticou o meião direito rumo ao abismo, depois o esquerdo, pra descer na marra estilo cabra do Himalaia.
Cês já imaginam a merda que isso tinha que dar.
Ele não caiu. Ele quicou. Veio aquele pogobol humano se desembolando uns 5, 6 metros barranco abaixo e cada quicada era uma medalha olímpica: a Dayane dos Santos pode pinotar o resto da vida até ficar com a bacia troncha e não vai conseguir repetir a magia daquele momento. Quando o barranco já não tinha mais nenhuma verticalidade a oferecer, a gravidade apresentou o grigo ao chão levemente mijado da Ponta Negra, com a mesma delicadeza que um motorista da Bertolini passa por cima de um buraco.
Eu tava passando por ali numa das minhas esperançosas tentativas de enxugar 20 anos de cerveja em 30 minutos de trote arrastado. Vi o OVNI gringo voltar ao planeta igual disco de pizza quando o pizzaiolo se distrai. Por um momento, fiquei naquele dilema terrível: será que eu corro pra ajudar a criatura, que afinal de contas contribui enormemente (e em dólar) para as divisas do meu estado? Ou será que simplesmente me cago de rir na frente dele, como estou muito inclinado a fazer?
Mas o dilema moral durou pouco: o gringo era viado. E viado, cês devem conhecer, tem aqueles superpoderes mutantes que ninguém adivinha, até que eles se manifestam. E o poder do gringo era o mesmo do The Flash: a bicha-relâmpago. No que bateu no chão, eis que o importado já se aproveitou da energia cinética e - sabe Deus como - chapou, chapuletou, jogou cotovelo prum lado, braço pro outro, girou tracajá no casco, paranauê, rabo de arraia, empinou, subiiiiiiiu... e em menos de DOIS SEGUNDOS era Anjo da Vitoria Secret - sem putaria: mão na cintura, queixo pro alto, passinho, pivô, beijinho no ombro, faz cara de rica e meu cu pras invejosa.
Véi, eu fiquei TÃO impressionado com a velocidade que a porra da bicha foi do chão ao camarote que eu não consegui rir: o queixo travou. Meu primeiro impulso depois disso foi pegar o celular e filmar aquilo pra mandar pro padre Quevedo ou pra Nasa, porque era coisa do Além. Mas não deu tempo. Que mais eu podia fazer? Só uma coisa: comecei a aplaudir ali mesmo, gritando ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRAAAA... EVOLUÇÃO... DEEEEEEZ!
Aquilo foi uma lição de vida. Tinha que ser gravado, estudado e virar palestra no TED. Sair de uma quase fratura múltipla e instantanemanete ficar de pé pra jogar beijo de carro alegórico é uma prova de superação e vontade humanas das mais raras. Sorry, terceiro mundo: vocês têm muito o que aprender.