sexta-feira, 12 de dezembro de 2008
"Malhação de pobre é vassoura, balde e fila do SUS, Bêibi!"
Essa foi a resposta que dona Marileuza, faxineira de certa cadimia ultra-mega-sou-novo-rico-sim-e-daí? lá da zona Centro-Sul, me deu quando lhe perguntei se os funcionários ganhavam bolsa pra malhar de grátis. Pergunta de frouxa retórica e larga cretinice de minha parte, claro, pois tava na vista que dona Marileuza não tinha bolsa de espécie alguma. Ela carregava os documento numa sacolinha plástica transparente, daquelas de pôr farinha (Agradecemos a Preferência).
Tá, mas que djabo eu tava fazendo na tal cadimia de bacana em primeiro lugar, perguntariam meus 2,4 leitores fiéis - que me conhecem de longa e sabem que meu condicionamento físico tá muito mais pra ala hospitalar que pra sala de musculação. Aí é que tá, meu povo: durante a tal campanha prefeiturável, eu consegui perder seis quilos dos poucos que me restavam e, antes que a ONU resolvesse buscar ajuda humanitária e helicópteros começassem a despejar alimentos e remédios na minha laje, eu resolvi que tava na hora de entalhar uma moldura mais saudável para minha pessoa. Aquela história: tinha um amigo de uma amiga que conhecia um fulano que tinha acesso a um não-sei-o-quê que dava desconto nas três primeiras mensalidades da academia chicosa. Não custava arriscar.
Esquema acertado, chego lá de tênis naftalinado, camisetinha Adidas do bate-palma e muita disposição. O lugar era de fato uma fábrica da boa forma: tinha piscina(s), ginástica(s), musculação, dança disso, luta daquilo, sauna, paredão de escalada, esteira com HBO. Só não tinha um técnico de plantão no estacionamento pra consertar a cancela automática da entrada, permitindo que o melhor pedigree da cidade tivesse acesso a tudo isso. Depois de uma meia hora preso lá em baixo, vendo o tormento do vigia enquanto ele cutucava a tal cancela até ela soltar faísca e resolver abrir, eis que adentro quase de penetra o templo de Adônis. Em sociedade com Afrodite: a quantidade de gente bonita era inversamente proporcional a de gente simpática. Sorriso, só das recepcionistas (e dava pra perceber que elas só mostravam a arcada superior porque eram pagas pra isso). Até aí, sem problema: eu definitivamente não estava ali pra fazer amigos ou influenciar pessoas.
O "Uau"! do início não durou muito, porém. Tudo bem, o lugar era fantástico, tinha zilhões de coisas pra fazer e coisa e tal. O ambiente era impecavelmente limpo, bem iluminado, cheiroso e coisa e tal. A manutenção era constante: você mal levantava do aparelho e já vinha uma tia passar paninho, e coisa e tal. Os instrutores eram bem preparados e tão atenciosos que praticamente faziam o exercício por você.
Então que merda tinha de errado, seu chato? Exatamente isso: nada. O lugar era perfeitinho demais. Impessoal, asséptico, inodoro, insípido e incolor. Uma atmosfera insuportável de arrogância velada, com um sistema de castas pouco evidenciado, mas bem evidente: as faxineiras, por exemplo, vestiam-se de cinza dos pés à cabeça - pra se confundir com a paisagem - e eram aparentemente proibidas de olhar nos olhos dos privilegiados frequentadores ou sequer lhes dirigir a palavra, nem que fosse pra dizer "com licença, o senhor largou seus pesos em cima do meu pé".
Talvez a revolução das máquinas tivesse começado por ali e eu estivesse cercado de andróides. Só pra testar a teoria, resolvi quebrar o protocolo e puxar papo com a faxineira mais próxima pra perguntar se ela era 110 ou 220. Nenhum alarme soou, felizmente. Tive tempo suficiente pra descobrir que a replicante tinha nome de batismo, e pude fazer a malfadada pergunta cuja resposta, tão crua em sua dolorosa sabedoria, virou o título do post.
Encurtando: continuo com seis quilos a menos, procurando um meio-termo saudável entre os supinos de cimento do Puraquequara e o Palácio de Versalhes dos marombeiros. Se alguém souber de uma academia honestinha, simpática, onde ninguém me fuzile com os olhos por usar tênis Olympicus e os funcionários sejam criaturas de carbono capazes de rir e organizar festinhas de confraternização cafoninhas e maravilhosas, por favor me indiquem. Nem precisa ter HBO na esteira: pegando a Globo tá bom.
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